Colocar uma menina jovem na frente de uma máquina pra ensiná-la a costurar pode até parecer uma coisa retrógrada e conservadora, mas, se pensarmos nas diferenças entre o nosso tempo e o da vovó, veremos que entender ao menos um pouquinho do processo de fabricação das roupas e se meter a mexer com ele é bem menos careta do que só usar roupas prontas de lojas.

Nossas avós, bisavós, tataravós e assim por diante tinham certa obrigação de saber costurar, pelo simples fato de que as roupas eram bem mais caras do que são atualmente. Então, se um botão caia, uma blusa rasgava, ou seu primo que cresceu lhe passava uma calça que não cabia mais nele, mas que ainda estivesse grande em você, não se podia apenas jogar todas essas coisas fora, mas sim ajeitá-las e torná-las úteis novamente: reciclá-las.

Usei a palavra reciclar de propósito. Por que hoje em dia se fala muito em ecologicamente correto, porém, a indústria continua produzindo objetos que deveriam ser duráveis, mas na realidade são descartáveis. A moda anda cada vez mais rápido pra que a gente compre cada vez com mais frequência, e aquela sua blusa nova VAI rasgar em três meses porque ela foi feita para isso. Eu nem sou tão velha assim, mas na minha infância as coleções mudavam só a cada seis meses. Hoje em dia, embora as semanas de moda só ocorram duas vezes por ano, chegam linhas novas às lojas a cada três meses. Isso quando não falamos no fast-fashion, onde algumas marcas especializadas nesse tipo de negócio trocam suas linhas a cada SEMANA.

arte moda

Pra sua avó, bisavó, tataravó e assim por diante, comprar roupas novas a cada semana não era uma opção, assim como costurar não era. Agora, pra nós, que vivemos numa época em que os produtos são feitos para em pouco tempo já causarem necessidade de novos, não comprar roupas em poucos meses parece também não ser uma opção. Mas pode ser, se a gente tiver o poder de maestrar ao menos um pouquinho a magia de costurar – também vale pagar uma costureira, mas aí não tem muita magia que salve a mesada…

Além das roupas hoje em dia serem menos duráveis, por mais que existam zilhões de lojas, com zilhões de peças, às vezes não conseguimos encontrar o que queremos – pode parecer difícil acreditar, mas nem tanto, porque é bem possível que você já tenha passado por isso – ou pior ainda, às vezes até encontramos algo que queremos, mas que por um detalhezinho ou outro não vai ficar bem no NOSSO tipo de corpo. Mas quando entendemos desses detalhezinhos, podemos olhar pra peça no nosso corpo e ver se dá pra apertar aqui, folgar lá ou dar uma encurtadinha pra peça ficar perfeita pra gente.

Acho que já convenci todo mundo de que costurar é MARAVILHOSO, chegou a hora deu parar de falar “porque” e começar a dizer” como”, em um tutorial super simples.  Se você ainda nunca tocou numa agulha, mas já quer ir dando uma experimentada, aqui vai um passo a passo do ponto atrás, o ponto básico para fazer costura à mão:

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  1. Passe uma linha no buraquinho da agulha e una as duas pontas com um nozinho duplo.
  2. Ajeite a linha na agulha – e isso é algo que você vai descobrir que vai ter que ficar fazendo o TEMPO TODO, parece chato, mas faça, porque às vezes a gente tá quase acabando uma costura que levou vinte minutos, daí a linha embola e você tem que desfazer e começar tudo de novo. Então SEMPRE ajeite a linha na agulha.
  3. Enfie a agulha no tecido de dentro pra fora, e depois de fora para dentro. Pronto, aí está o PRIMEIRO ponto.
  4. Agora, passe a linha novamente nos mesmos dois buracos onde você já passou – isso só se faz no primeiro e último ponto, pra ser mais difícil de descosturar. Tem gente que passa ainda uma terceira vez, se quiser garantir, garanta.
  5. Pro segundo ponto: faça o terceiro furo – de novo de dentro pra fora – numa distância o mais parecida possível com a do primeiro pro segundo – essa distância deve sempre ser a menor possível, o ideal é em torno de dois a três milímetros, mas pra começar, tenta uns cinco.
  6. Agora, a razão do nome: ao invés de fazer um quarto furo, volte, agora de fora pra dentro, enfiando a linha no segundo furo – o segundo ponto não foi feito indo pra frente e sim voltando pra trás (tcharam!)
  7. E pra todos os pontos seguintes é assim que se faz: quando a linha for de dentro pra fora ela pula um furo já feito e faz um novo pra frente, quando ela for de fora pra dentro ela volta um ponto para trás!

Caso você tenha vontade de se aventurar na máquina de costura, também é bem simples: basta ler o manual e descobrir como se enche a carretilha e coloca a linha na agulha. Uma vez com a máquina montada, é só colocar um pano em baixo do pezinho da máquina e o seu pé no pedal e pronto, você está costurando. A grande questão é o corte, as emendas, os zíperes, os ajustes…

Para o aprendizado de algumas coisas é necessário ver alguém fazendo, fazer junto, principalmente pra construir uma roupa do zero. Mas é possível pegar algumas manhas e ir se familiarizando com a arte de costurar aos poucos no nosso dia-a-dia. A melhor maneira de começar a entender onde e como acontece a costura é literalmente virar as coisas do avesso! Algumas roupas mais complexas, como casacos e vestidos, têm a preocupação de esconder bem a costura com forros e outros tipos de acabamentos, mas as camisas, camisetas e os jeans são mais relaxados e, portanto, os melhores pra explorar.

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Com alguma observação entendemos como um pedaço de tecido se liga no outro pra formar as partes de uma peça de roupa, por exemplo, e também vemos que algumas peças tem detalhes de costura que ligam uma parte nela mesma ou se desliga dela mesma por motivos diferentes. Esses ajustem tem nomes e cada um deles uma função. Na pence, por exemplo, é quando pegamos uma parte da roupa, dobramos pra dentro e costuramos para deixá-la mais justa em alguma parte. É muito útil na cintura de camisas e vestidos, ou no quadril de calças.

Conforme sacamos as costuras apenas pela observação das roupas já vamos nos soltando e nos metendo a fazer uma coisinha aqui e outra acolá. Daí já é super válido conversar com a família ou os amigos, com certeza alguém já aprendeu a costurar e pode te receber em casa uma tarde pra ensinar um pouquinho e tomar um chá. Se não houver ninguém, dê uma volta pelo seu bairro ou perto de sua escola, veja se encontra algum alfaiate ou costureira com um ateliê pelos arredores, entre e converse sobre o seu interesse em aprender a costurar. Cada pessoa é diferente e pode ser que alguns deles não estejam muito dispostos a conversar, mas muitas vezes eles podem e se interessam. Por experiência própria, eu fiz isso uma vez nas férias da sétima série. Conversa foi, conversa veio, e a linda da Teresa me recebeu no ateliê dela todas as tardes durante três semanas. Enquanto eu a ajudava desfazendo os pontos de uma barra ou de um vestido que ela tinha que ajustar, ela ia me ensinando a mexer na máquina industrial, a tirar molde a partir da peça pronta, a colocar zíper, fazer arremate… E com os retalhos que sobravam no cesto dela e também uma enorme paciência e dedicação de ambas as partes, eu voltei às aulas com uma carteira e um colete de confecção própria.

Se depois dessas aventuras você perceber que realmente gosta e se interessa, daí vale a pena fazer um curso de corte e costura. Às vezes nas conversas com as costureiras e alfaiates eles mesmos já te indicam alguém que se dispõe a ensinar. No centro de São Paulo e em bairros como o Bom Retiro e o Brás – muito conhecidos por suas confecções – existem vários cursos de diferentes valores e em cada bairro ou cidade deve haver pelo menos um ou dois cursos. Existem algumas escolas que vendem uma imagem “fashion” e descolada com cursos super modulados (costura básica I e II, camisa, calça I e II)… Em geral esses cursos levarão um semestre inteiro – que vai custar caro – pra você aprender a fazer uma única peça – e você só vai aprender a fazer a peça daquele jeito. Prefira os cursos que se propõem a ser mais pessoais, com turmas pequenas e onde você tenha mais liberdade de ir aprendendo com base no que você está projetando.

Fonte: Revista Capitolina