Nos lares de boa parte das famílias brasileiras, na década de 1960, alguns objetos ocupavam um lugar de destaque. A lista incluía o rádio, o toca-disco e a máquina de costura. Enquanto os dois primeiros eram vistos como objetos do desejo em matéria de lazer, a última era cobiçada como um instrumento eficiente para poupar dinheiro ou, então, gerar renda extra – seja pela produção de roupas para uso próprio, seja para a venda para terceiros. Neste cenário, quem dava as cartas era a americana Singer, que desembarcou no País em 1858, ainda no tempo do Segundo Império.

Ocorre que o produto, que 100 anos depois ainda estava presente em metade dos lares brasileiros, de acordo com o IBGE, foi perdendo espaço progressivamente. Em 1995, apenas 35% das residências contavam com esse item, resultado do barateamento do preço das roupas produzidas em escala industrial. No entanto, esse ciclo de baixa começa a dar sinais de reversão. Um deles é a expectativa de crescimento das vendas da empresa para 2014, em relação ao ano passado. A meta é avançar 12% para US$ 104 milhões.

“As brasileiras voltaram a comprar máquinas de costura”, afirma Valter Bezerra, presidente da Singer no Brasil e vice-presidente na América Latina. Segundo o executivo, esse movimento está relacionado ao aumento no número de pessoas que veem nesse equipamento doméstico uma forma de ampliar a renda, como costureiras e artesãos. “Quando o PIB não vai bem, a venda de máquinas cresce”, diz Bezerra, que destaca a importância do ofício de costureira em tempos mais desafiadores. Embora a questão da renda seja relevante, não explica tudo.

Nos Estados Unidos, por exemplo, o renascimento da máquina de costura tem sido induzido por uma tendência meio hippie na produção de roupas próprias a partir de retalhos, conhecida como patchwork. Sem contar o número de mulheres que optam por confeccionar as roupas com as antigas modistas, ou por conta própria, apostando em modelitos exclusivos. Essas ondas começaram a tomar forma a partir de 2000 e ganharam impulso nos últimos anos, na esteira do que aconteceu naquele país e na Europa na década de 1990. “Os trabalhos manuais viraram uma febre”, afirma Bezerra.

Para fisgar essa nova consumidora, sem perder o contato com as tradicionais clientes, a Singer investiu em novidades. Hoje, parte de seu portfólio é composto por máquinas com visor de LCD e componentes eletrônicos que permitem programar a sequên­cia de pontos. A empresa também bolou uma estratégia específica de vendas para lojas virtuais. “Este tem sido um canal importante na comercialização de produtos”, diz Bezerra. As escolas de corte e costura também permanecem no radar do executivo, que vê na proximidade com as alunas a chance de fidelizar a clientela.

“Essa é uma forma de se manter relevante para o seu público, o que faz a marca continuar tão forte”, diz Ana Couto, CEO da Ana Couto Branding, consultoria em estratégia de marca. Tamanho esforço se deve à extrema dependência dos americanos em relação ao produto, que responde por 90% de seu faturamento no Brasil. O restante é obtido com ferros de passar. Dife­rentemente do que ocorreu na década de 1980, quando os americanos apostaram em um ousado projeto de diversificação global, com a abertura de lojas de eletrodomésticos. Por aqui a Singer chegou a contar com 50 pontos de venda, que foram repassados à extinta Brasimac em 2000.

Bezerra participou ativamente desse processo como diretor de marketing. Intensificou as ações a partir de 2006, quando assumiu o posto atual. A produção local foi mantida nas unidades de Juazeiro do Norte, cidade do interior do Ceará conhecida como a terra do mítico Padre Cícero, padroeiro da população nordestina, e Indaiatuba, no interior de São Paulo. As máquinas com maior número de componentes eletrônicos são importadas da China e do Vietnã, como forma de preservar a margem de lucro. É com manobras como essas que Bezerra espera costurar o futuro da velha senhora no Brasil.

Fonte: Isto É Dinheiro